Experiências. Realidades do contexto educacional rural na Colômbia

Realidades do contexto educacional rural na Colômbia
As sociedades rurais no contexto latino-americano e colombiano caracterizam-se por sua grande diversidade étnica, cultural e geográfica, o que faz desses territórios um amálgama de saberes e modos de habitar o meio rural. No caso particular da Colômbia, por exemplo, existem três populações culturalmente diferenciadas: camponeses, indígenas e afrodescendentes, que representam parte da grande pluralidade de identidades e expressões culturais das comunidades que ocupam o território nacional.

“Camponeses, indígenas e afrodescendentes, que representam parte da grande pluralidade de identidades e expressões culturais das comunidades que ocupam o território nacional”

Portanto, para a Colômbia torna-se uma necessidade imperativa o reconhecimento de um exercício educativo diferenciado, isto para responder às particularidades dos territórios e comunidades ali presentes, permitindo assim ao professor e à professora identificar as várias nuances incluídas em dados contextos, políticos, econômicos, ambiental, cultural, entre outros; alcançando assim uma práxis educacional rigorosa, na qual, como afirma Parra (1996), é necessário.

Assim, devido à situação atual em nível nacional e global, relacionada com a respectiva emergência sanitária, mais uma vez, tem-se revelado a importância e relevância do trabalho desenvolvido pelas comunidades nos territórios rurais, posto que o abastecimento alimentar das principais cidades e de milhões de moradias dependem do trabalho do campesinato, permitindo, desta maneira, voltar o olhar ao campo, identificando-o como parte essencial e fundamental na conservação dos modos de vida e da sociedade colombiana.

Segundo as estatísticas nacionais, cada quatro em cada dez professores desenvolvem o seu trabalho pedagógico e educativo no meio rural. De acordo com o estudo Docência Rural na Colômbia: Educando para a Paz em Meio ao Conflito Armado (2019) “em 2018, no país se encontravam vinculados 309.889 docentes, dos quais 34% (106.679) estão em áreas rurais; 64% na área urbana; e o percentual restante não possui registro da área ”(Compartir, F, p. 113). Assim, é necessário reconhecer que da totalidade dos territórios colombianos nos quais se desenvolvem os processos educativos, uma porcentagem significativa é ocupada pelos setores rurais, mas os/as professores/as que ali exercem o seu trabalho o fazem em condições precárias decorrentes do atual déficit socioeconômico em nosso país, características que, embora o caracterizem, também o limitam.

Portanto, para a Colômbia torna-se uma necessidade imperativa o reconhecimento de um exercício educativo diferenciado, isto para responder às particularidades dos territórios e comunidades ali presentes, permitindo assim ao professor e à professora identificar as várias nuances incluídas em dados contextos, políticos, econômicos, ambiental, cultural, entre outros; alcançando assim uma práxis educacional rigorosa, na qual, como afirma Parra (1996), é necessário

Uma atitude pedagógica que lhe permite utilizar os saberes da cultura comunitária a favor do seu trabalho docente, que lhe permite enraizar o saber escolar com o saber comunitário, a socialização primária e secundária e a afetividade como forma de compreender e unir diferentes mundos.

Neste período, com o advento da situação pandêmica, as instituições de ensino em nível nacional determinam a utilização de ferramentas tecnológicas como forma preferencial de dar continuidade ao desenvolvimento das respectivas ações pedagógicas e educativas; entende-se que, na atualidade, as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) representam um requisito indispensável para o/a professor/a, que é capaz de se apropriar de aplicações que favoreçam o processo de ensino-aprendizagem. Assim, essa circunstância torna-se um desafio para o/a professor/a, que transpõe seu trabalho para as condições exigidas pela virtualidade.

“Uma atitude pedagógica que lhe permite utilizar os saberes da cultura comunitária a favor do seu trabalho docente, que lhe permite enraizar o saber escolar com o saber comunitário”

Agora, pensada esta realidade escolar para as crianças que habitam o meio rural, realizar o acompanhamento virtual torna-se uma questão sem sentido devido a duas condições específicas: a primeira, recai sobre a falta de conectividade em grande parte dos territórios rurais da Colômbia ; a segunda, relacionada à escassa formação e apropriação de professores/as rurais no uso das TIC como estratégia pedagógica na aprendizagem de crianças e jovens rurais. Por isso, decide se voltar o olhar para opções alternativas de comunicação que também ofereçam a possibilidade de uma formação significativa e legítima como o rádio e a televisão, que em dado momento eram estratégias de sucesso para a formação dos habitantes rurais.

No caso específico do rádio, tem um sinal amplo e, portanto, é capaz de atingir os lugares mais remotos, por meio de emissoras comunitárias e municipais, meios de difusão em que geralmente são veiculados programas alternativos e populares. Historicamente, a rádio popular tem sido na América Latina e na Colômbia uma ferramenta de divulgação de projetos políticos comunitários que promovem a construção e a organização social das comunidades, consolidando assim uma identidade camponesa, como exemplo do exposto, encontramos o programa educativo Rádio Sutatenza na Colômbia, a Associação Latino-americana de Educação em Rádio (ALER).

Na Colômbia, o Ministério de Tecnologias da Informação e Comunicações da Colômbia (MinTIC) propõe a utilização desses canais de comunicação como possibilidade de promoção e difusão de conteúdos educacionais públicos aplicados à televisão, rádio e web, propondo assim, a ideia de uso o rádio como mediação pedagógica. Nesse sentido, “La Radio Televisión de Colombia (RTVC) […] está comprometida com a evolução para uma rádio, televisão e web contemporâneas, dinâmicas, atrativas, mais próximas do público para promover e fortalecer o desenvolvimento cultural e educacional dos habitantes de território nacional”. (MinTIC, 2004)

“Historicamente, a rádio popular tem sido na América Latina e na Colômbia uma ferramenta de divulgação de projetos políticos comunitários que promovem a construção e a organização social das comunidades, consolidando assim uma identidade camponesa”

De acordo com o exposto, é necessário afirmar que, na Colômbia, as rádios locais contam com ampla cobertura para hospedar as comunidades rurais mais remotas, com alto grau de dispersão em cada um dos municípios de nossa geografia, em decorrência, com um grupo de professores/as, propomos o planejamento, construção e posterior divulgação de uma faixa de rádio, como instrumento de mediação pedagógica que permite aos professores/as rurais um acompanhamento alternativo, preciso e rigoroso dos processos pedagógicos das raparigas e dos rapazes que habitam as escolas. trilhas nos municípios de Madrid e Sibaté.

Concepção coletiva de Mestra Terra
Partindo do interesse pela formação em investigação e pela reflexão acadêmica em torno da educação para o meio rural e as populações camponesas, foi criado e organizado em 2019 o Grupo de Estudos Mestra Tierra (GEMT), constituído majoritariamente por estudantes das licenciaturas em Ciências Sociais, Artes Cênicas, Psicologia e Pedagogia e Educação Infantil (LEI) da Universidade Nacional Pedagógica (UPN) com sede em Bogotá, Colômbia, além de professores/as formados/as pela mesma instituição, em parceria com uma estudante de Antropologia da Universidade Externado da Colômbia , e toda essa equipe sob a direção da professora do ensino superior Claudia Liliana Sierra.

Assim, consolida-se um grupo interdisciplinar de professores e professoras em formação e em exercício que têm focado seu percurso e trabalho educativo na promoção, fortalecimento e empoderamento das comunidades camponesas, isto a partir da reivindicação de suas práticas socioeducativas, principalmente em alguns territórios rurais do município de Sibaté, Cundinamarca.

Por sua vez, desde 2015 o Curso de Bacharelado em Educação Infantil sob orientação da professora Claudia Liliana Sierra, vem desenvolvendo as práticas pedagógicas do ciclo de aprofundamento de estudantes cujo interesse está voltado para a extensão de sua experiência formativa em cenários rurais, neste caso, nos municípios de Sibaté e Madrid, estes enquadram-se, principalmente, na modalidade de turmas multisseriadas e / ou escolas unitárias; em Madrid, a Escola Rural Valle del Abra pertencente à IED San ​​Patricio e, em Sibaté, o exercício é realizado na Instituição Educacional Departamental (IED) Romeral, e suas escolas anexas organizadas ao longo das calçadas, Las Delicias, La Cantera , Usaba, Águas Claras e Bradamonte, que se tornaram o lugar onde o/a aluno/a em formação configura e reafirma seu fazer docente.

Desta forma, no mês de março, com o início da quarentena e, portanto, com a transferência das atividades do setor educacional para o plano virtual, a necessidade de repensar as estratégias pelas quais professores/as e instituições poderiam continuar acompanhando meninos e meninas que fazem parte das escolas rurais desses dois municípios, que inicialmente consistiam na elaboração de guias pelas professoras, porém, as estratégias implementadas até então não atendiam às necessidades evidenciadas nos contextos e, ao mesmo tempo, não garantiam que as meninas e os meninos tivessem uma aprendizagem significativa.

Diante desse panorama, é convocada uma reunião entre o reitor da IED Romeral e os diretores das escolas conveniadas, para discutir a viabilidade deste projeto como meio alternativo de comunicação pedagógica, na qual se conclui abrir caminho para esta aposta e gerar convênios com a estação Sibaestero. Forma-se, assim, um amplo grupo interdisciplinar entre docentes em formação, docentes regulares e membros do GEMT, que juntos traçam um objetivo principal: socializar o saber e o saber de forma alternativa, didática e significativa, utilizando a rádio popular como meio de disseminação.

A Maestra Tierra no Ar passa então a ser um compromisso educativo de carácter político, pedagógico e formativo, à disposição das crianças das zonas rurais, mais afastadas do centro de Sibaté e de Madrid, e assim, apesar das medidas de isolamento social preventivo, dá continuidade de seu processo escolar.

“Objetivo principal: socializar o saber e o saber de forma alternativa, didática e significativa, utilizando a rádio popular como meio de disseminação. Maestra Tierra no Ar passa então a ser um compromisso
educativo de carácter político, pedagógico e formativo, à disposição das crianças das zonas rurais, mais afastadas”

Composição orgânica da aposta educacional radiofônica
Uma vez estabelecidos os vínculos anteriormente mencionados, docentes regulares e docentes em formação, através de um diálogo de saberes, tendem a constituir uma faixa de rádio educativa buscando captar a atenção de meninas e meninos independentemente da idade e assim mantê-los/as sintonizados/as, propõem-se intervalos entre segmentos que, além de dar continuidade e entrelaçar os conteúdos, oferecem um acompanhamento musical e um relato dos aspectos importantes de cada sessão educativa apresentada. Isso implicou a flexibilização dos currículos, possibilitando a integração das áreas do conhecimento com as realidades e saberes locais das famílias e comunidades que habitam os territórios rurais.

A seguir, são trazidos à tona cada um dos segmentos que fazem parte do programa de rádio e sua identidade. Ceniciencia: seus dois personagens principais, Ceniciencia e Guambitico, compartilham sua paixão por investigar as maravilhas da Colômbia, convidando à expressão e à exploração. Personagens Ocultos; em que se destacam as histórias de meninos e meninas, trazendo à tona seus saberes camponeses de cunho social e cultural. Histórias de campo; Alí, são compartilhadas histórias de diferentes partes da Colômbia que contam histórias que falam de seus costumes, tradições orais, seus próprios saberes, entre outros, caracterizando passo a passo o território.

“Flexibilização dos currículos, possibilitando a integração das áreas do conhecimento com as realidades e saberes locais das famílias e comunidades que habitam os territórios rurais”

Em Viajando com Mestra Terra; os ouvintes podem aprender sobre outras experiências, percepções e sentimentos de diferentes contextos na Colômbia, a partir do exercício de sua imaginação e narrativa oral. Só sei que nada sei; onde se destaca a qualidade e a possibilidade que as crianças têm de perguntar, sendo o reflexo dos sentimentos, percepções e ideias construídas pelas crianças. Por fim, Vozes de la Tierra, se consolida como um espaço de rádio teatral, com diferentes personagens e histórias que permitem que a imaginação voe. A tudo isso se soma a participação da personagem Mestra Terra, que se destaca por ser uma mulher sábia, representativa e defensora dos recursos naturais, que mantém em seus diálogos uma linguagem que lembra a da camponesa do cerrado que trabalha em harmonia com a terra.

Nesse sentido, para a construção e desenvolvimento desses programas de rádio os protagonistas têm sido meninos e meninas de diferentes partes do território nacional, como, por exemplo, Cali, Bogotá, Madrid, Sibaté, Ciénega, Tumaco, Neiva, comunidade indígena Muisca de Suba, Indígena Cabildo de los Pastos, que com suas vozes dão vida aos personagens de cada segmento, expressando a identidade de um programa voltado para meninos e meninas, realizado por e para eles.

Sulcos que nos conectam a Mestra Terra
A primeira emissão do programa foi dada através da estação Sibaestereo 88,3 FM em Sibaté, posteriormente é transmitida na Cundinamarca Stereo 96,4 FM, estação sintonizada no município de Madrid. Posteriormente, o programa aconteceu na rádio UPN Rádio La Pedagógica. Atualmente o programa é transmitido na estação alternativa da rádio Sibaté Tug10, aos sábados e domingos pela manhã. Da mesma forma, os programas tiveram a possibilidade de download através de plataformas como WhatsApp, YouTube e Anchor.fm, apostando em maior cobertura com essas alternativas. Cada uma destas emissões foi acompanhada dos respectivos cartazes publicitários elaborados pela equipe de professores responsáveis ​​pelo programa radiofónico, nos quais o dia, a data e a hora da emissão são referenciados nas diferentes redes de rádio.

“Para a construção e desenvolvimento desses programas de rádio os protagonistas têm sido meninos e meninas de diferentes partes do território nacional”

“Cm suas vozes dão vida aos personagens de cada segmento, expressando a identidade de um programa voltado para meninos e meninas, realizado por e para eles.”

Colhendo a Primeira Colheita da MestraTerra
Mestra Terra no ar, deixou rastros relacionados às formas e possibilidades de participação nos processos educativos de meninos e meninas, tanto nas escolas rurais vinculadas ao projeto, como também daquelas que participam de sua configuração, deixando em evidência a importância de assumir ferramentas alternativas de formação como estratégias que, além de apoiarem o trabalho em sala de aula, o transcendam, fortaleçam e o transformem.

Da mesma forma, segundo o que foi expresso pelos diretores, este programa de rádio tem mitigado a evasão escolar, tendo em conta que, apesar de muitas famílias não possuírem as ferramentas tecnológicas destinadas à divulgação de informação educacional, conseguiu acessar isso através do rádio e, portanto, do programa. importância de fornecer conteúdos que permitam a meninas e meninos realizar um processo educativo quanto à conservação, resistência e sobrevivência das tradições camponesas diante de uma inevitável desnaturalização entre o ser humano e / ou o planeta Terra.

Consequentemente, esta proposta radiofônica representa um espaço propício para a construção e replanejamento de uma educação que leve em conta as particularidades da infância, bem como seus contextos. Nessa condição, as crianças têm conseguido ser participantes ativos em seu próprio processo educacional, dando lugar a retroalimentação e fortalecendo seus conhecimentos, dando sentido à multiplicidade de linguagens, simbolismos e práticas cotidianas.

Considerações Finais
Em suma, por meio dessa proposta educacional evidencia-se a importância e a necessidade de analisar os conteúdos e aprendizados estabelecidos a priori nos currículos, tendo em vista que muitos desses obedecem a uma estrutura educacional hegemônica, o que limita e impede que meninas e meninos sejam os autores e protagonistas de sua própria aprendizagem; Da mesma forma, todas aquelas ferramentas que alimentam processos alternativos de ensino-aprendizagem são evidenciadas e resgatadas, que permitem que alunos/as, professores/as e famílias convergem para um mesmo interesse e trabalhem juntos para alcançá-lo.

Em decorrência do exposto, é necessário afirmar que, na perspectiva de um dever educativo, essa se torna a forma pela qual meninas e meninos conseguem explorar o mundo, a fim de constituir, a partir da experiência, aprendizagens aplicáveis ​​em seu cotidiano e vida, apropriando-se e reivindicando construções sociais e culturais próprias do seu meio e da comunidade camponesa a que pertencem.
“Meninas e meninos têm manifestado suas ideias, experiências e conhecimentos, utilizando
a voz como meio legítimo de comunicação, construção e transformação”

Nesse sentido, entende-se que educar de forma diferenciada e alternativa permite que meninas e meninos identifiquem os aspectos a destacar em seu contexto, bem como as problemáticas que lhes dizem respeito, tendendo à construção de estratégias que se estabelecem como contribuição à solução dos atuais problemas enfrentados pela população rural colombiana, como vem ocorrendo ao longo da construção e veiculação do programa de rádio, no qual meninas e meninos têm manifestado suas ideias, experiências e conhecimentos, utilizando a voz como meio legítimo de comunicação, construção e transformação, tudo em prol de uma educação alternativa, contextualizada e significativa para professores/as e crianças.

Notas
Canal de YouTube Maestra Tierra Educación Rural:
https://www.youtube.com/channel/UC0ZXw9V5An0ATAYTw9vgJDw

Página web Maestra Tierra Podcast:
https://anchor.fm/maestra-tierra

Página de Facebook:
https://www.facebook.com/GrupodeEstudioMaestraTierra/

Bibliografía
Compartir, F. (2019). Docencia Rural en Colombia, educar para la paz en medio del conflicto armado.
MinTIC. (2014). Radio Televisión de Colombia (RTVC). Recuperado el 14 de junio de 2020 en https://www.mintic.gov.co/portal/inicio/4030:Radio-Televisi-n-de-Colombia-RTVC
Parra Sandoval, R. (1996). Escuela y modernidad en Colombia. La escuela rural. II Tomo. Tercer mundo editores.

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